Ainda que dezenas de vezes eu
pense em partilhar convosco, algumas reflexões, indagações ou simples “devaneios
metafísicos”, constantemente me deparo com compromissos e também muitas “distrações”,
que não raramente, me desencaminham do real objetivo.
Sempre gostei de escrever, desde
muito “menina” vivia com cadernos a tiracolo, que se transformavam em “diários
secretos” (não tão secretos assim), porquê minha mãe lia-os de “cabo a rabo”, o
que obviamente causava-me grande indignação, constrangimentos, muitas
discussões e não só…
Verdade seja dita, creio ter
deixado um pouco o “velho hábito”, também por alguma dificuldade linguística,
que atribuo ao facto de ser brasileira e morar há 12 anos em Portugal… Ou seja,
já desaprendi como se escreve corretamente o “português do Brasil” e não domino
as regras gramaticais, sobretudo no que diz respeito ao uso dos verbos, no “português
europeu”. Assim, posso afirmar que a minha escrita, fruto da migração,
tornou-se uma idiossincrasia.
Portanto, ainda que possa vir a
ferir algumas suscetibilidades, me perdoem tanto brasileiras (os) como portuguesas
(es)!
Estou no carro, numa tarde de
sábado (isso foi ontem), cinzento e chuvoso, à espera do meu filho mais novo,
que está no treino de “Basket”. Como
tenho de esperá-lo por mais de hora e meia, resolvo aproveitar esse tempo para
escrever alguma coisa de jeito! Procuro por caneta (que de preferência escreva)
e algum papel (encontro toneladas de faturas de supermercado e catálogos
promocionais) e finalmente entrego-me ao ato, sem pestanejar (sei que para nós
brasileiros estas frases soam “um bocado”, estranhas)…
A primeira ideia que surge é
escrever sobre “relações tóxicas”, porquê mensalmente acompanho dezenas de
pessoas que mantêm vínculos “sanguessugas”,
ou como o PE. Fábio de Melo refere em seu livro – Quem Me Roubou de Mim? – indivíduos
cujos parceiros (as), “sequestraram a subjetividade do outro”.
Contudo, a fim de romper a retórica
de que nós psicólogos, estamos sempre a retratar problemas, achei mais
pertinente (ainda mais agora que o frio está à porta), falar sobre ligações saudáveis!
Mas o que é ou deveria ser uma relação
salubre??? Ainda que cada indivíduo possa ter diferentes expetativas e
conceitos acerca de tema tão vasto e profundo, imagino que algumas premissas
sejam fundamentais e “se calhar”, universais… Estar com o outro, seja este
outro (a) quem quer que seja, deve “acrescentar” (enriquecer, adicionar) e “edificar”
(construir, induzir ao bem e à virtude) o parceiro (a), tornando a vida em
comum um processo de partilha, tolerância e autoconhecimento recíproco.
Numa relação saudável há que coexistir o “par” e o “particular”, ou
seja, há que ter “espaço” (lugar), para cada indivíduo desenvolver às suas
próprias capacidades e interesses, bem como exprimir livremente e sem “amarras”
ou “reticências”, seus pensamentos, emoções ou ideologias (religiosas,
políticas ou sociais).
Numa ligação construtiva, cada
elemento sente-se “incondicionalmente” respeitado e valorizado na sua essência
e igualmente desenvolve ou aprimora recursos e estratégias para proporcionar ao
outro elemento, a mesma capacidade de “acolhimento” e “satisfação”.
Não, uma relação saudável não é e
nunca será perfeita, porquê somos seres imperfeitos e em constante
desenvolvimento (físico, emocional, psicológico e social), mas sem dúvida será
uma ligação com equilíbrio, equidade e solidariedade. Pessoas que se unem para
partilhar uma vida ou parte dela e que estabelecem um vínculo onde não existe
espaço para discussões infundadas, desrespeito, desconfiança. Viver um relacionamento
salutar é não perder tempo em “discutir a relação” e sim vivê-la; explorar
sensações, emoções, partilhar momentos, perspetivar o futuro e recordar com
satisfação o passado.
Sugiro que nesse momento, faça um
exercício bastante simples. Imagine viver a sua relação (assim, da forma que
está nos últimos meses), nos próximos cinco, dez anos ou 20 anos… Veja quais
são as emoções e reações físicas, que esse pensamento desencadeia. Feche os
olhos e observe atentamente.
Se você vive uma relação saudável,
seu corpo e suas emoções manifestar-se-ão dessa maneira! O corpo é sempre o
melhor sinalizador. Caso contrário, reflita, fique atento (a) e procure apoio
de um profissional.
Excelente semana para todas e todos!
Ana Saladrigas